Wes Talaveira
Há duas semanas a equipe do blog vem trabalhando em uma nova série de posts que seria lançada em junho, a série Precisamos Falar, para debater temas como aborto, ideologia de gênero, machismo, influência da religião e outros. Com o acontecimento trágico da semana passada, acabamos por antecipar a série, publicando o texto que segue abaixo:
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Muito se tem falado por esses dias sobre a “cultura do estupro”, depois que fomos expostos a mais um caso lamentável de estupro coletivo, dessa vez contra uma garota de 16 anos no Rio de Janeiro. Um movimento bonito tem tomado conta da internet para denunciar essa cultura que reduz a mulher a um simples objeto sexual que serve apenas para ser usado pelo ser masculino para diversão.
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Muito se tem falado por esses dias sobre a “cultura do estupro”, depois que fomos expostos a mais um caso lamentável de estupro coletivo, dessa vez contra uma garota de 16 anos no Rio de Janeiro. Um movimento bonito tem tomado conta da internet para denunciar essa cultura que reduz a mulher a um simples objeto sexual que serve apenas para ser usado pelo ser masculino para diversão.
Mas o fato é que o problema é um pouco mais profundo do que isso. A cultura do estupro é, na verdade, a ponta de um iceberg grande, pesado e perigoso que vem fazendo a cada dia mais vítimas pelo mundo afora: o machismo.
Sim, o machismo é um monstro de várias cabeças que está presente em todos os lugares. Nas ruas, nas famílias, nas religiões, na política, em todos os lados vemos comportamentos machistas, ora condenáveis, ora aceitos.
Sou da opinião de que ninguém nasce machista. Aprendemos o machismo ao longo da infância, no meio em que vivemos, na escola, ia igreja ou com nossos pais. Sim, nossos pais – inclua aí pai e mãe – nos ensinam a sermos machistas, e após aprendido é necessária uma boa dose de boa vontade e humildade para reconhecer esse ranço no nosso comportamento e retirar isso. Comparo identificar o machismo a retirar carrapatos de um cachorro que encontramos na rua: são necessários muito tempo e paciência pra identificar, um a um, os pontos machistas em lugares por vezes imperceptíveis.
Mas onde está esse tal machismo no nosso dia a dia que as vezes nem percebemos?
Quando o pai ensina que existem “brinquedos de meninos”, sempre brinquedos ligados à inteligência e perspicácia, e “brinquedos de menina”, sempre ligados à casa e a família, estamos incutindo o pensamento machista em nossos filhos.
Quando ensinamos ao menino que “homem não chora”, e “chorar é coisa de mulherzinha”, estamos ensinando o machismo aos nossos filhos.
Quando ensinamos apenas a menina a ajudar nas tarefas da casa, como lavar, passar e limpar, estamos ensinando o machismo aos dois.
Quando dizemos que “rosa é cor de menina” e cores escuras e neutras são cores mais adequadas aos meninos, estamos ensinando nossos filhos a serem machistas.
Quando você matricula sua filha no ballet e seu filho no judô e acha impensável que um faça a atividade do outro, você está ensinando o machismo ao seus filhos.
Quando você ensina sua filha a admirar as princesas da Disney e seu filho a gostar de guerreiros de artes marciais, você está ensinando machismo aos seus filhos.
Quando, em vez de ensinar seu filho a ser educado e cordial com todos, você ensina seu filho a ser cavalheiro porque “mulheres são fracas e precisam do apoio de nós homens fortes”, você está ensinando seu filho a praticar o machismo.
Quando você condena seu filho que quer deixar os cabelos longos por ser “cabelo de mulher” ou condena sua filha que quer cortar os cabelos porque vai ficar “parecendo homem”, você está praticando o machismo.
Quando você leva seu filho a um puteiro para que a primeira vez dele seja com alguém “que sabe das coisas”, você está ensinando o machismo ao seu filho.
Quando você ensina a sua filha a se vestir de modo “comportado”, sem chamar a atenção, para “se preservar” porque “homem é tudo igual, só quer se aproveitar de você”, você está ensinando sua filha a aceitar o machismo.
Quando você ensina ao seu filho que para chegar em uma mulher ele deve ser “incisivo” – ou seja, puxá-la pelo braço sem lhe dar muito tempo para pensar, você está ensinando seu filho a praticar o machismo.
Quando você diz ao seu filho que há mulheres para casar e mulheres para curtir, e que as segundas não merecem o mesmo respeito das primeiras, você está ensinando seu filho a ser machista.
Quando você ensina a sua filha a sonhar com um casamento e com filhos, mas ensina seu filho a trabalhar e conquistar o próprio dinheiro, você está plantando o machismo.
Viu como o machismo está mais presente em nossa vida do que pensamos?
Viu como o machismo está mais presente em nossa vida do que pensamos?
Poderia citar aqui uma lista infinita de exemplos de como o machismo está presente na forma como nos comportamos, nos relacionamos e como vivemos, mas a intenção é apenas lançar a semente para que você mesmo faça esse trabalho no seu dia a dia.
O machismo não faz mal apenas as mulheres. Os homens que não são gays mas que não se enquadram no “padrão masculino de comportamento” também sofrem com essa cultura machista que ensina que qualquer comportamento diferente do socialmente aceito é “coisa de mulherzinha”.
Como se existissem “coisas de mulherzinha” e “coisas de homenzinho”.
Observe sua rotina. Veja a forma como você se comporta com as pessoas com quem convive e identifique o machismo. E o principal: mude esse comportamento.
A cultura do estupro só vai deixar de existir se cortarmos o mal pela raiz. E essa raiz tem nome: se chama machismo.
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Wes Talaveira é publicitário, social media e mora em SP